segunda-feira, 18 de março de 2024

Morreu um poeta

 

Morreu mais um poeta e o dia fez-se sombra e há frio dentro do calor. Retiro tempo ao trabalho para ler os seus poemas, era capaz de ficar o dia todo a fazê-lo.

Este poeta era da terra da minha mãe e enchia os seus versos de uma simplicidade aparente, usando muitas vezes a palavra amor, amante e amada. Que belos são os homens que não têm receio destas palavras, agora costumam trocá-las por outras mais leves e menos cheias.

Tenho a certeza que ele gostava de amendoeiras em flor, de gatos e de mar, os seus poemas têm lá dentro essas coisas, são cheios do que o sul deixou nele quando se tornou um homem da cidade.

Foi o bicho maldito, aposto que também militou no calvário dos sem cabelo e mesmo assim perdeu. Só 74 anos. 

~CC~


PS. Adeus Nuno Júdice, prometo ler-te muitas vezes.

domingo, 17 de março de 2024

Renúncia

 

Tão calado, tão reservado. Por isso demorei até te ver. E não me lembro do momento em que os teus olhos estavam a brilhar no encontro dos meus. Depois vi os teus lábios, esses sim, não esqueci. Por algum tempo o desejo de os beijar alumiava os meus dias e ocupava as minhas noites. E lembro aquele jogo em grupo em que cada um tinha que dizer o que tinha encontrado naquele espaço que nos juntava. E tu disseste muito baixinho: o amor. Alguém ficou espantado e perguntou mas não quiseste dizer mais nada, os olhos demoradamente fitos em mim.

E depois renunciámos, acho que primeiro tu, depois eu, ou talvez tenha sido cada um à vez. Às vezes é assim, congelamos o amor, sabemos que não o podemos viver. A impossibilidade reside apenas na certeza de que não poderemos ser felizes sabendo que o fazemos na sombra da tristeza de alguém. Tu e eu erámos assim. Escolhemos a terceira pessoa, a que estava no meio de nós.

~CC~

sábado, 16 de março de 2024

Resistir


Dizia Sebastião da Gama à morte que se ela o viesse buscar não lhe queria dar um morto mas alguém bem vivo para que ela se arrependesse de colher uma flor e uma esperança. Era a sua tentativa de chamar um Deus justo. 

Tento por estes dias lembrar-me disso,  que posso ser a papoila que nasce nos passeios mal a Primavera espreita.

Já as ouviste cantar?! Posso ensinar-te.

~CC~



quinta-feira, 14 de março de 2024

Caixa de bombons (X)

 

A mulher do fato amarelo, muito requintada, com o seu motorista fardado a oferecer-lhe um bombom que tirava do porta luvas. Há publicidades que ficam e esta atravessou os tempos. Não sabemos exactamente porque registamos estas coisas. Eu nunca quis ser como a mulher do fato amarelo e muito menos ter um motorista, a não ser quando as subidas são ingremes, os estacionamentos difíceis e a minha inabilidade me confronta e me incomoda. E no entanto aquele chocolate é todo um fascínio que se foi tornando banal pelas casas do mundo (e não lhe digo o nome, pois não me apetece fazer-lhe publicidade).

Preto por fora e bem no meio uma avelã crocante, algo semelhante ao que a senhora do fato amarelo provava com deleite. À partida a avelã bem disfarçada não parecia existir pelo que a surpresa foi agradável pois em geral adoro frutos secos. Nunca me esqueço de um filme que vi sobre uma tribo afegã que se alimentava praticamente só de nozes. São maravilhas da natureza mas em geral trabalhadas pelo homem que as coloca a secar, antigamente apenas à luz do sol, em grandes mantas ou tapetes colocados no solo. Alguns dão muito trabalho a conseguir, como as amêndoas ou pinhões e há em cada saquinho muito suor. É preciso dizer às crianças que não nascem nas prateleiras dos supermercados assim já prontos a comer.

Este ano falhei as amendoeiras algarvias, houve anos em que fui pela serra para beber da beleza desse branco. No Douro nunca as vi, mas gostava.

Estes bombons sugerem cada viagem...

~CC~



terça-feira, 12 de março de 2024

E agora o dia é teu...

 


Para a história dos momentos mais felizes: o teu nascimento. E nem parece já ter sido há tanto tempo, tal é  a memória viva.

E melhor, ainda hoje me trazes amiúde um sorriso.


~CC~